Bem vindos !

Este blog foi criado para você que está pensando em ser religioso.

Você já conhece a Ordem dos Frades Pregadores?

Caso não conheça, faça um bom proveito do nosso blog.

sábado, 8 de setembro de 2012



A ORAÇÃO NA VIDA DOMINICANA

Frei Ronivalder Biancão, OP.

Para que a vida religiosa seja de fato aquilo que seu nome diz, ela deve ser fundamentada, sobretudo, na oração e na mística. Na vida dominicana, a oração é tida como um dos três pilares que sustentam o carisma da pregação, sendo os demais: o estudo e a vida comum.
Costuma-se dizer, entre nós dominicanos, que esse é o tripé da Ordem dos Pregadores. Sendo assim, se um dos apoios deste tripé  está ausente ou se algum deles é de tamanho inferior, tudo aquilo que eles procuram sustentar, vem a desmoronar. Nessa ótica, portanto, deve-se haver um equilíbrio entre os três apoios (ou pilares).
Mesmo que a oração pareça ser vista como distinta, frente aos demais pilares, ela, pelo contrário, circunda os elementos da vida comunitária e da vida de estudo, dando sentido a eles, como nos diz a Constituição Fundamental:

[...]. “Tais elementos, solidamente ligados entre si, harmoniosamente equilibrados e fecundando-se mutuamente, constituem, na sua síntese, a própria vida da Ordem: vida apostólica, no pleno sentido, na qual a pregação e o ensino devem emanar da abundância da contemplação.”(LCO, § IV).

A oração é a relação íntima da pessoa com Deus (CIC §2560), que pode ocorrer através de diferentes meios. Somente quem fez uma experiência íntima com Deus, na pessoa de Jesus Cristo, é que dará verdadeiro sentido à sua consagração de vida pelo Reino (DA, 243). Assim, o estudo e a vida comunitária serão vivenciados apostolicamente e as dimensões desta consagração (castidade, pobreza e obediência) não serão tidas como conseqüências da opção pela vida religiosa, mas, antes, vistos à luz da pregação e do testemunho de Jesus Cristo, serão frutos de uma escolha consciente pelo amor a Deus.
Dentro da vivência comunitária encontramos na Eucaristia o centro de irradiação do nosso propósito de vida:

“[...] Nela, os irmãos, juntamente com Cristo, glorificam a Deus pelo propósito da sua vontade e pela admirável concessão da graça, e rogam ao Pai das misericórdias por toda a Igreja e pelas necessidades e salvação do mundo inteiro. A celebração da liturgia é, pois, o centro e o coração de toda a nossa vida, cuja unidade radica principalmente dela.” (LCO, 57).


“Contemplari et contemplata aliis tradere” (São Tomás de Aquino). Esta frase de São Tomás de Aquino resume qual deve ser o sentido de nossa oração: contemplar as maravilhas de Deus presentes na nossa vida evangélica e transmitir aos outros os frutos dessa contemplação, não somente por palavras, mas também pelo testemunho de nossa vida. Segundo frei Felicíssimo Martinez Diez OP, a fé radical é o único ponto de apoio de todo projeto de vida religiosa. Nessa visão, “o religioso é (ou pelo menos tem o dever de ser) um mestre espiritual, uma testemunha de Deus no mundo”. (DIEZ, 2003, p. 36).
 O diferencial da vida dominicana, comparada à vida religiosa monacal, é justamente seu caráter profético; assim, oramos (estabelecemos contato com Deus) também, de forma implícita. Isso ocorre quando nos conservamos no amor e na doação ao próximo, seja pelo grito de denúncia contra injustiças em favor dos oprimidos, seja no auxílio dos que carecem do necessário para sua subsistência, porque Cristo quis identificar-se misticamente através dos irmãos: “Tudo o que fizerdes a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes” - Mt 25, 40 (FORESI, 1988, p. 103). Esse aspecto profético da oração é a fé encarnada nas realidades onde nos encontramos. São Domingos tinha a experiência com o transcendente contemplando a Deus a partir do coração sofredor da história humana: de dia falava de Deus aos homens e de noite falava dos homens a Deus (cf. Beato Jordão de Saxônia).
Nessa ótica, recordamos os nossos irmãos e irmãs da Ordem dos Pregadores que tinham uma vida profundamente marcada pela oração, ou melhor, suas vidas eram uma oração, uma expressão de profunda comunhão com Deus, como por exemplo, Antônio de Montesinos, Bartolomeu de Las Casas, Catarina de Sena, Rosa de Lima, Martinho de Lima, Henrique Suzo, entre outros. Assim como eles, não poderíamos deixar de cultivar os momentos de oração pessoal, pois o silêncio propicia a familiaridade com Deus (LCO, 66).  Nas suas longas vigílias, nosso pai Domingos orava, não somente com palavras ou no silêncio do coração, mas colocava todo seu corpo em oração. É o que podemos ver nas “Nove maneiras de rezar de São Domingos”. Cada gesto de São Domingos traduzia as intenções pelas quais ele se dirigia a Deus, não somente em seu próprio favor, mas também em favor dos pecadores e da missão da Ordem e da Igreja:

  1. Inclinação profunda: por ela São Domingos tornava-se totalmente submisso diante do Criador do mundo e comparava sua pequenez diante da grandeza do Senhor, proclamando a magnitude de Seu Nome.
  2. Vênia: com o rosto por terra, implorava a Deus o perdão de suas faltas e das faltas de toda humanidade. Pedia também que Deus afastasse dele todo projeto e pensamento que o desviasse de sua missão.
  3. Disciplina: por meio da autoflagelação, sentia-se tão responsável pela pregação da Verdade, como Jesus o foi, tomando em si mesmo o sofrimento do próximo.
  4. Genuflexão: mantendo os olhos fitos na cruz de Jesus, esperança dos que crêem em seu favor, depositava toda sua esperança n’Ele para o bom êxito de sua pregação, pedindo sempre a graça necessária para esse fim.
  5. Em pé, em contemplação: estando em pé, juntava as mãos, como se estivesse segurando um livro, e meditava a Palavra de Deus. Bem baixinho pronunciava textos da Sagrada Escritura com suavidade e devoção, como se alguém estivesse conversando com ele.
  6. De braços abertos: foram feitas orações nessa posição em momentos marcantes, como quando ocorreram os milagres. São domingos rezava dessa forma quando algo de extraordinário viria a acontecer.
  7. Mãos levantadas para o céu: nessa posição parecia receber algo do céu: os dons do Espírito Santo para a Ordem e para a Igreja.
  8. A meditação: logo após as horas canônicas, reservava um tempo para meditar algum livro ou os evangelhos num local isolado e silencioso.
  9. Em viagem: durante uma viagem afastava-se um pouco dos companheiros e, enquanto caminhava, rezava e fazia o sinal da cruz constantemente. Era aí que o Senhor inspirava palavras de sabedoria para serem colocadas em sua pregação.

Notamos que todos os elementos do carisma dominicano propiciam espaço à oração, porém, devemos ater-nos para não absolutizarmos os meios pelos quais dispomos para esse contato íntimo com Deus. Esse aspecto absolutizante, faz-nos perder a verdadeira mística. Essa problemática é tratada pelo jesuíta Carlos Domínguez Morano, num trecho de uma entrevista:

“[...] Não confundamos nenhum dos sinais de Deus com Deus mesmo. Essa é a grande tentação da pessoa religiosa: confundir Deus com os sinais de Deus, absolutizar a mediação, fazer da mediação um Deus. Então, uma das grandes contribuições dos místicos é a de relativizar tudo o que podemos pensar e dizer sobre Deus e suas mediações. Por isso, os místicos são, também, suspeitos nas instituições religiosas, já que questionaram tudo. De algum modo, viveram uma experiência em que compreenderam que tudo o que dizemos de Deus é, e não é teologia negativa. Por isso, a instituição está sempre zelosa da ortodoxia, dos sinais que querem absolutizar. Absolutizar o templo como espaço sagrado; o tempo de uma densidade sagrada que não aparece em outros tempos; o saber numa proporção dogmática. O místico sabe que não pode confundir Deus com o templo, com os tempos e com os saberes. Esses são somente mediações que levam ao mistério, porém, não um mistério que produz inquietude, medo, mas confiança, porque é um mistério amoroso. [...]”.



2 comentários:

  1. Olá. Saudações fraternas. Muito interessante este texto. Cordialmente.
    Aniel Rodrigues

    ResponderExcluir
  2. A espiritualidade dominicana, nesses termos, parece-se um pouco com a redentorista... Vocês disseram: "contemplar as maravilhas de Deus presentes na nossa vida evangélica e transmitir aos outros os frutos dessa contemplação, não somente por palavras, mas também pelo testemunho de nossa vida"... Assim, também, nós, redentoristas, fazemos. Ao contemplarmos o mistério da redenção da cruz, nós entendemos o que a vida em Cristo, pode mudar...

    ResponderExcluir